O VELHO DO RESTELO


“Personagem quase histórico da epopeia lusíada, o Velho do Restelo é, contudo, um símbolo que adquire especial vigor nos momentos cruciais da História, na charneira entre um passado já gasto e um futuro alimentado pela Alma de um povo que se reencontra. Destino histórico, evolução, grandeza, são ideias que só de as ouvir fica arrepiado. Mudo, trémulo, acobardado nos momentos de glória, nunca se dá por vencido e aproveita as menores falhas para esgrimir as suas sentenças injuriosas a coberto de um falso humanismo adaptado às situações criadas.
É um sobrevivente.
Eternamente apoiado nos valores estabelecidos, é incapaz de fazer História, mas vive à custa da história que os seus “inimigos” fizeram. Tem a capacidade reptante de se moldar às situações novas, mas, tal como um parasita, em vez de as servir, serve-se delas para seu próprio interesse. É um oportunista. Muda na forma, mas nunca no conteúdo. Quando os “ventos” sopram a favor, o medo que nunca o larga adquire segurança, o rosto descontrai-se-lhe e a voz emite tons afáveis e monocórdicos em detrimento da verve iracunda. Porém, pouco importa de onde sopram os ventos, pois o medo fá-lo andar sempre armado com a fiel Demagogia.
Este Velho continua bem vivo (e rejuvenescido para a idade que tem) nos dias de hoje, pululando alegremente (tipo menino rabino) nas ruas, templos, casas e parlamentos, fustigando o seu látego envolto na melosa e pérfida voz da demagogia. Demagogia esta que recobre o medo de perder os seus pergaminhos. Entretanto, subrepticiamente, lá vai roubando o vigor das nossas almas.
Bufão, hediondo, mascarado de rei, enfeitiça-nos com as suas danças macabras e histéricos risos. Tomou o trono vazio, convertendo-nos em enganados prosélitos de seu jogo.
O Velho do Restelo vive entre nós. Durante anos e anos sucumbimos, por falta de experiência, ao seu encanto. Porém, quando novos valores se alevantarem a sua malediciência, cobardia e conservadorismo estéril serão transmutados.” – Eduardo Amarante