O que vemos nas nossas democracias modernas? Fizeram-nos crer que os homens são todos iguais e que o objectivo último é alcançar a liberdade. Ora acontece, e fazendo fé no que Platão nos diz, que a liberdade é algo que pertence à esfera do indivíduo, ou seja, é um produto da consciência interna de cada um. Um homem pode ser socialmente livre, mas ser escravo de si próprio. Por exemplo, todo o homem que actua condicionado por alguma coisa, seja pelos seus instintos, seja pelos seus prazeres, ou mesmo pelas opiniões alheias que o induzem a fazer de uma maneira e não de outra, etc., não é livre, pois não é mestre das suas próprias decisões. A liberdade não vem de fora. A liberdade é um estado interior e, como tal, só o indivíduo pode alcançá-la e vivê-la.
Uma sociedade só pode ser livre quando cada um dos seus cidadãos, individualmente, for livre. É algo que depende exclusivamente de cada um, porque um homem verdadeiramente livre não depende do exterior para agir. Os famintos reclamam pão; os escravos reclamam liberdade.
Não será Platão de uma grande actualidade? As suas reflexões adaptaram-se perfeitamente ao drama do século XX e às consequências que se farão sentir no início deste terceiro milénio. Durante muitos anos persuadiram-nos de que a democracia podia justificar todos os crimes cometidos, tendo as palavras perdido o seu sentido real e sendo utilizadas abusivamente para fins pessoais egoístas. É assim que se explica que existam tantas democracias no mundo, das mais diversas cores, e que a luta entre elas nunca finda.
Em nome da democracia “liberalizam-se” os povos do terceiro mundo, “protegidos” por uma ou outra das grandes potências actuais que disputam o predomínio de vastas áreas para fins inconfessáveis. Fazem-se guerras em nome da democracia e da liberdade dos povos, sem que estes tenham tido a oportunidade de expressar livremente o rumo que querem seguir.
Em certos países de África, o povo não tem pão, não tem instrução, mas tem armas; na Índia, há aldeias onde a escola e a electricidade ainda não chegam a todos, mas onde já chegou a coca-cola.
A imposição da liberdade aos homens não é possível, é uma utopia, ou melhor, uma mentira. No mundo actual, globalizado, existem algumas pessoas que simplesmente utilizam a “liberdade” para explorar. A liberdade serve, em muitos casos – para não dizer na sua grande maioria –, para que os mais hábeis e sem escrúpulos explorem o povo indefeso e facilmente sugestionável. Os seus desígnios têm apenas um objectivo: fazer alguém escravo dos seus interesses.
Em nome da liberdade os tiranos de hoje cometem as maiores arbitrariedades e apanham nas suas malhas os incautos que acreditam nas suas palavras. No mundo global, podemos espalhar o bem, mas o mal também facilmente se multiplica...
Eduardo Amarante