A visão estreita e dogmática de uma “história linear” cujo corolário (anti) natural seria a etapa científico-positiva que, pressupostamente, agora vivemos, engendrou um elevado número de absurdos, desde a pretensa origem símia do género humano, até ao mito do “paraíso” tecnológico e à própria negação ou, no mínimo, antropomorfização de Deus. A chamada “idade contemporânea” é o retrato das mentes que pensam na horizontal e que não encontraram melhor qualificativo para designarem – dentro do seu esquema utópico – a época que sucedeu à convencional e apelidada “idade moderna”. Como refere O. Spengler:
«O conceito de ‘Época Moderna’ não permite nenhuma continuação do processo histórico, e depois de ter sido ‘esticado’ várias vezes já não pode suportar outras dilatações, como demonstra claramente a expressão ridícula e desesperada de ‘Época Contemporânea.’»
Não é, pois, de espantar que dentro de um tal panorama tragicómico com as suas sequelas de horror e ignorância ressurgisse, à luz do dia, todo um lote de disparates e aberrações – que pareciam ter sido já sepultados pelo tempo –, próprios do período mais negro da Idade Média europeia.
Paradoxalmente, uma época que, como a nossa, se diz científica, vê renascer no seu próprio seio velhas superstições e um medo muito particular face ao desconhecido quando, em simultâneo, a mesma ciência pretende ter explicações para tudo. Só assim se explica que em pleno século XX tenha sido proclamada oficialmente, pelos teólogos cristãos, a existência do Diabo!
E, por este andar, não sabemos se vamos assistir, no início deste milénio, à posição teológica quanto ao perfil do demo, à localização exacta do Inferno ou às discussões se os anjos têm sexo ou não, como aconteceu num Concílio no período mais obscuro da Alta Idade Média.
Face a estas aberrações que hoje reaparecem e que os mais cândidos julgavam definitivamente banidas, urge procurar uma posição filosófica activa e construtiva que nos permita combater a ignorância e o complexo de culpa que nos vem do facto de termos fracassado como civilização. Mais tarde ou mais cedo o materialismo acabará porque os seus dias estão contados, e o Diabo não é mais do que o álibi daqueles que, impotentes na sua missão de elevar as almas das pessoas, socorrem-se de mil e um artifícios e superstições para se manterem à tona de água.
De facto, os actuais demagogos são verdadeiramente maquiavélicos. Ao verem a sua situação periclitante e em perigo não hesitam, com o engenho e a arte e o engenho de que são mestres, em inventar tudo o que lhes dita a sua astúcia, a fim de sobreviverem no meio das pessoas, amedrontando-as para melhor as subjugar. Resta-nos, pois, trabalhar denodadamente para que volte a amanhecer na História.
Eduardo Amarante